Em dezembro de 2004, agentes da Base Aérea de Salvador BA, atearam fogo em dezenas de documentos referentes as ações clandestinas das Forças Armadas brasileiras no período da ditadura militar.
A rede Globo (oficialista) noticiou no programa fantástico o acontecido.
Dias após o episódio, eu publiquei e assino a seguinte nota abaixo transcrita:
PONTO DE VISTA
QUEIMA DE ARQUIVOS NA CASERNA
Carlos Alberto Bento da Silva*
Em 1970, aos 15 anos de idade, me alistei no serviço militar obrigatório e em 1971 já estava servindo no Exército. Entrei para o PELOTAR do 22° Grupo de Artilharia de Campanha, em Uruguaiana RS. O comandante daquela unidade militar era o Ten Cel Dickson Melges Grael, um pára-quedista. Em 1972 dei Baixa do 22° GAC.
Em janeiro de 1973 fui reincluido no Exército e designado a servir no 18° BIMtz. Era integrante da 2ª Cia Op (Companhia de Operações Especiais), unidade especializada em contraguerrilha e de assalto. A unidade era formada por vários pára-quedistas e comandos de sobrevivência e guerra na selva. Da 2ª Cia de Operações Especiais, alguns militares participariam da guerrilha do Araguaia, mas não sei precisar o numero. O treinamento era bastante forte, faziam parte de uma coluna descaracterizada (a paisana, em atividades civis diversas). O que me deixava intrigado era o fluxo constantes de presos civis no quartel, era comum o translado de presos políticos de uma unidade militar para outra. As mais utilizadas eram a 1ª Cia. de Guardas e o 3º BPE, além de QG do 3º Exército. O objetivo era dificultar a sua localização. O fato de uma tropa de elite manter sob sua guarda prisioneiros políticos e civis já é motivo suficiente para se exigir à entrega de todos os documentos referentes a este período. A censura era uma constante até mesmo entre militares. Naquele momento e em varias partes do Brasil, as dependências do DOI-CODI (Departamentos de Operações Internas – Centro de Operações de Defesa Interna) e várias unidades do Exército estavam lotadas de pseudos subversivos. Muitos morreriam torturados, enquanto outros desapareceriam.
Contrariado com tudo que presenciei e passei a entender, decidi desertar. Saí de licença por uns dias e nunca mais retornei. A partir daí minha vida mudou por completo. Em 1975 e após ter fugido para a Argentina, retornei ao Brasil e perambulei por vários estados, levando uma vida esguia e anônima. No ano de 1981, em Porto Alegre, entrei numa lanchonete, deparei com o cabo Dias (armeiro da 2ª Cia Op) que avisou-me de que estava sendo procurado. Para o Exército, naquele período, deserção é traição. No meu caso, a lei de anistia de 1979 teria validade? Assustado, em outubro de 1982 tentei asilo na embaixada da França, foi uma decepção. Hoje fico abismado e indignado de ver documentos de importância vital para a história do Brasil, serem queimados e jogados no lixo e, o que é pior, ao arrepio da lei e do estado de direito. Aos generais detentores de comandos importantíssimos e, da segurança nacional, ficará o débito da cumplicidade e da autoria deste crime de lesa pátria, que é a queima da memória e da historia política recente.
Ao presidente Lula fica patenteado sua incompetência e fragilidade frente a uma questão moral e jurídica que assola o país. Existem alguns generais que ainda se comportam como no tempo da ditadura e da lei do mais forte. Recentemente o general brasileiro* das tropas invasoras do Haiti dirigiu-se aos governantes brasileiros com arrogância. Toda vez que autoridades do governo Lula comentam alguma coisa sobre o período da ditadura militar, são prontamente rotulados de revanchistas. Da mesma forma acontece o recuo destas autoridades que vacilam e temem alguma reação da parte de setores militares que em nenhum momento acataram ou cumpriram a lei de anistia engendrada por eles próprios.
A maior comprovação está na reação, no monitoramento e no fichamento de lideranças políticas e militantes dos movimentos populares em todo o Brasil. Recentemente, lideranças populares de São Paulo denunciaram esse tipo de ação patrocinada pelo governo Alckmin. Ao presidente Lula, caberá demitir e afastar todo e qualquer funcionário público envolvido nestas ações criminosas, incluindo aí os militares que são pagos com o dinheiro dos impostos recolhidos da população.
Texto de:
(*)Carlos Alberto Bento da Silva, militante do PSTU em Florianópolis.
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