Por Celso Lungaretti*
Nunca esquecerei a 3ª luta entre os extraordinários Muhammad Ali e Joe Frazier.
As duas primeiras, com uma vitória de cada lado, haviam sido inconclusivas.
Ali acumulara pontos suficientes para, pelo menos, empatar a 1ª, apesar do knock-down sofrido no último assalto. Assim não entenderam os jurados, despertando fortes suspeitas de que fatores extra-ringue pesaram na sua decisão. Ser um símbolo do repúdio à Guerra do Vietnã acarretava consequências de todo tipo, como se constata num excelente filme de Stephen Frears, A maior luta de Muhammad Ali.
Também não pareceu ter vencido a 2ª, novamente por pontos.
No tira-teima, Ali teve Frazier totalmente à sua mercê no 14º round, mas preferiu não desferir um golpe poderoso contra o adversário grogue. Pediu ao juiz que encerrasse a luta e, não sendo atendido, deixou o tempo escorrer até o soar do gongo.
Primeiramente, por ter utilizado uma defesa que tinha enorme chance de produzir o resultado que produziu.
Depois por, apesar das lágrimas de crocodilo que derramou sobre o pobre Anderson Silva, ter feito questão de trombetear aos quatro ventos que treinara muito tal defesa com o joelho, por ele justificada como uma maneira de intimidar os oponentes, dissuadindo-os de utilizarem chutes baixos.
Ou seja, quis que todos soubessem que o ocorrido não fora obra do acaso. No fundo, no fundo, ele considera a fratura uma proeza; talvez emoldure uma foto do brasileiro se contorcendo em dores para colocá-la na sua estante de troféus.
Concordo com Weidman: não foi mesmo por acaso. Foi por ganância, ambição e insensibilidade. Por considerar que não há limites quando se trata de engordar sua conta bancária e alavancar sua carreira.
Há quem prefira centrar suas críticas na bestialidade das MMA e na morbidez do público que lhe garante estrondoso sucesso financeiro. Mas, o julgamento de Nuremberg consagrou o princípio de que a ninguém é dado praticar atos hediondos sob a justificativa de que cumpria ordens superiores (ou, no caso presente, de que contusões são aceitáveis nos esportes em que há contato físico).
Nada obriga o lutador a infligir no colega de profissão as dores mais terríveis, talvez danos permanentes, talvez a morte. Mesmo nessas arenas de gladiadores modernas, geralmente há como evitar o pior. Muhammad Ali o fazia. Já o repulsivo Weidman não tem a mais remota preocupação em evitar o pior (pouco importando o fato de que Anderson Silva também não seja um anjinho, apelando frequentemente para os perigosíssimos chutes na cara).
Considero-me um brasileiro cordial, quase sempre compassivo. Mas, no que tange a Weidman, seria um hipócrita se me mostrasse condescendente. Torço para que Vitor Belfort chegue às mesmas conclusões que eu::
- quem encara o esporte como uma guerra, merece sofrer, como esportista, as consequências de uma guerra;
- quem trata o adversário como inimigo, como inimigo deve ser tratado pelo adversário seguinte.
(*) Jornalista e escritor
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu comentário somente será publicado se estiver dentro do contesto desta publicação.