Frenesi na internet: o que estarão tramando agora os linchadores de Cesare Battisti?
Foi o que me perguntaram, preocupadíssimos, vários companheiros, abarrotando minha caixa de mensagens.
Respondo: em termos práticos, o quadro em nada mudou.
Não confiem na imprensa burguesa. Ela mente, como sempre, a serviço dos reacionários daqui e da Itália. Não se vexa de priorizar os interesses de uma nação estrangeira, tomando partido contra a soberania e a dignidade nacional.
O que houve foi o seguinte:
já no julgamento, depois de perderem a terceira votação, os ministros linchadores do STF fizeram forte pressão sobre Eros Grau, tentando forçá-lo a alterar seu voto, ao que ele respondeu, irritado, que votava exatamente como seus colegas Carmen Lúcia, Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio de Mello;
o advogado brasileiro que defende a causa italiana (desconsiderando as pressões exorbitantes e afirmações arrogantes com que aquela nação reagira à decisão legítima do Governo do seu país) apresentou questão de ordem, solicitando o esclarecimento do voto de Grau;
até as pedras sabem que a Itália jamais deveria ter sido admitida como parte de um processo desses no Brasil, mas a dupla linchadora Mendes/Peluso lhe concede, desde o início, a TUTELA de todos os trâmites, de forma que, mais uma vez, acolheu-se uma exigência descabida italiana;
aí, sabe-se lá por quais meios, Grau foi convencido a voltar atrás, não votando mais exatamente como seus quatro colegas, e sim num meio termo (Lula é mesmo quem dá a decisão final, mas levando em conta o tratado de extradição existente entre Brasil e Itália).
No próprio julgamento, Grau discorrera sobre a redação imprecisa dos termos desse acordo. Segundo ele, o presidente da República, em última análise, pode seguir à vontade sua convicção íntima, desde que contemple uma das sete possibilidades que lhe permitem negar a extradição.
Ou seja, se Lula acreditar que Battisti estará em perigo na Itália, não vai precisar provar, basta ser este seu entendimento.
Motivos para recusar a extradição por riscos que Battisti correria, aliás, ele tem aos montes, sendo estes os mais fortes:
o serviço secreto do Exército italiano já conspirou para sequestrar Battisti no exterior (em 2004), só não o fazendo porque os mercenários contatados discordaram da quantia oferecida, tendo a tramóia vazado depois para a imprensa;
já insinuaram represálias os carcereiros (o sindicato de marieschalli de Udine e de Milão, e a federação de carcereiros da Itália);
ministros italianos, idem (tanto o da Defesa Ignázio La Russa, que é neofascista convicto e enfrentou Battisti em manifestações de rua nos anos de chumbo, quanto o da Justiça Clemente Mastella, que, segundo o Corriere della Sera, afirmou a vítimas da ultraesquerda que estava mentindo -- “f...endo os brasileiros” -- ao prometer a redução da pena de Battisti para viabilizar a extradição, pois, uma vez entregue, “o palhaço vai ficar na cadeia a vida toda”);
as seções especiais de isolamento da Itália provocaram 62 suicídios de prisioneiros submetidos a tais rigores carcerários só nos 10 primeiros meses de 2009, sendo 13 os presos políticos que se suicidaram desde 1974, além da morte suspeita de alguns outros (por negligência e falta de cuidados médicos).
Quanto à possibilidade de que a Itália conteste mais uma decisão soberana do Governo brasileiro, aproveitando a cabeça-de-ponte que instalou no STF, ela existiria de qualquer maneira.
Mas, o mandato do ultradireitista Gilmar Mendes como presidente do Supremo vai só até abril de 2010. É impensável que o substituto proceda de forma tão incompatível com suas funções, pois seria a pá de cal na credibilidade do STF. Tudo leva a crer que a tônica da próxima gestão será o resgate da liturgia da mais alta corte do Judiciário.
VIRADA DE MESA
Tudo isso considerado, para que serviu, afinal, a decisão ridícula de mudar a proclamação do resultado?
Como bem notou o ministro Marco Aurélio de Mello, tratou-se de uma virada de mesa:
“Não se pode reabrir o julgamento, ainda que se tenha um conflito entre fundamentos e dispositivos. A segurança jurídica é básica no Estado democrático de Direito. Não podemos ficar depois de um julgamento reabrindo em sessões subsequentes o que foi assentado de forma correta ou não pelo plenário".
Trocando em miúdos, o trâmite deveria ter sido o de sempre:
proclamado o resultado no final do julgamento, o relator redige a ementa e a envia aos ministros;
se um(ns) deles considera(m) que algo não está de acordo com o que se passou em plenário (tanto em relação ao próprio voto quanto ao conjunto dos trabalhos), manifesta(m) sua discordância;
o relator refaz o texto e submete a nova apreciação, até que se chegue a uma forma satisfatória para todos;
o acórdão é publicado.
Então, depois de resolver apreciar um caso que, segundo a Lei vigente e a jurisprudência consolidada em vários processos anteriores, já havia sido decidido pelo Governo brasileiro, o STF inovou mais uma vez, proclamando agora o que só deveria constar (se constasse) do acórdão.
Qual o motivo de mais essa virada de mesa?
Simples: fornecer munição propagandística para a imprensa conivente, de forma a intensificar a pressão sobre Lula.
O temor real da Itália & serviçais é de que o presidente, honrando a soberania nacional e sua própria biografia, liberte Battisti por motivos humanitários neste Natal.
Para precaver-se, criaram mais um factóide, evidenciando a extrema importância que conferem ao Caso Battisti.
En passant, desmentiram novamente a si próprios: não fossem políticas suas motivações, estariam perdendo tanto tempo, ultrapassando de forma tão grosseira os limites diplomáticos (o embaixador da Itália acaba até de ameaçar o presidente Lula com um impeachment!!!) e mobilizando recursos tão abundantes e sonantes?
Então, faço minha a sugestão de Carlos Lungarzo, da Anistia Internacional dos EUA:
“...a solução é a idéia dada há alguns meses por Rui Martins. Lula deve assumir sua condição legítima de presidente plebiscitado e dar indulto e asilo a Battisti. O STF poderá pedir seu julgamento. Eu me pergunto: pensamos que povo é tão ingênuo que vai trocar o maior período de bem estar da história do país, o ponto mais alto da economia e das relações sociais brasileiras, para satisfazer uma coisa que não entendem: um obscuro impeachment promovido por forças repulsivas?”
Vale dizer que fui o primeiro a desaconselhar a proposta de Rui Martins no início do ano, por considerar que pareceria uma afronta ao Judiciário, dando munição ao inimigo.
Ao longo de 2009, entretanto, os linchadores do STF se desmoralizaram de tal maneira que não resta nenhuma dúvida, para os cidadãos isentos e dotados de espírito de Justiça, de que os trâmites deste caso estão sendo totalmente anômalos, de uma parcialidade extrema.
O presidente Lula tem poder para dar fim a uma terrível injustiça: a manutenção de um homem como preso político num país que não mais admite prisões por motivos políticos.
Então, encerro com um apelo, que é o dos melhores brasileiros: Presidente Lula, liberte Cesare Battisti já!
Texto de Celso Lungaretti
Jornalista e Escritor
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