Leon Trotsky
25 de Setembro de 1939
Transcrição autorizada |
Primeira Edição: The New International [New York], Vol.5 No.11, November 1939, pp.325-332.
Fonte: "Em Defesa do Marxismo", publicação da Editora "Proposta Editorial"
Tradução de: Luís Carlos Leiria e Elisabeth Marie
Fonte: "Em Defesa do Marxismo", publicação da Editora "Proposta Editorial"
Tradução de: Luís Carlos Leiria e Elisabeth Marie
Transcrição de: Icaro Daniel Petter
HTML de: Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: © Editora Proposta Editorial. Agradeçemos a Valfrido Lima pela autorização concedida.
HTML de: Fernando A. S. Araújo.
Direitos de Reprodução: © Editora Proposta Editorial. Agradeçemos a Valfrido Lima pela autorização concedida.
Arquivo marxista na Internet
Após
a realização do pacto germânico-soviético, será possível considerar a URSS com
um estado operário? O futuro do estado soviético já suscitou entre nós, várias
discussões.
Não
é de estranhar; temos diante de nós a primeira experiência de um estado
operário na história.
Antes
disso, este fenômeno nunca acontecera para que pudesse ser analisado.
Como
já havíamos dito anteriormente, frente ao problema do caráter social da URSS,
os erros habitualmente acontecem, como o de substituir o fato histórico pela
norma programática.
O
fato histórico se desvincula da norma. No entanto, isto não significa que a
norma não tenha mais valor; ao contrario, foi reafirmada a partir do ponto de
vista negativo.
A
degeneração do primeiro estado operário, investigada e explicada por nós,
somente mostrou, mais graficamente, o que deve ser um estado operário, o que
poderia e deveria ser sob determinadas condições históricas.
A
contradição entre o fato concreto e a norma, não nos leva a negar a norma, mas
ao contrario, lutar por ela através de uma via revolucionária.
O
programa da revolução que se aproxima na URSS está determinado, por um lado,
pela nossa análise da URSS como um fato histórico objetivo, e por outro, pela
norma que define um estado operário.
Não
dizemos: “Tudo está perdido, devemos começar tudo novamente”. De forma muito
clara, indicamos aqueles elementos do estado operário que atualmente podem ser
preservados, mantidos e posteriormente desenvolvidos.
Aqueles
que hoje se esforçam para demonstrar que o pacto germânico-soviético modifica
nossa análise sobre o estado soviético mantêm, na essência, as mesmas posições
que o Comintern – ou mais exatamente, as mesmas posições que
o Comintern defendia ontem.
De
acordo com esta lógica, a missão histórica do estado operário é a luta pela
democracia imperialista.
A
“traição” das democracias, em prol do fascismo, faz com que a URSS deixe de ser
considerada um estado operário.
Na
verdade, a assinatura do tratado com Hitler só proporciona um
elemento extra, com o qual pode-se medir o grau de degeneração da burocracia
soviética e seu desprezo pela classe operária internacional, incluindo
o Comintern, mas não dá nenhuma base para uma revisão da apreciação
sociológica da URSS.
Comecemos
por colocar o problema da natureza do estado soviético, não em um nível
sociológico-abstrato, mas no plano das tarefas políticas concretas.
Admitamos,
por um momento, que a burocracia é uma nova “classe”, e que o atual regime da
URSS é um sistema especial de exploração de classe. Que novas conclusões
podemos tirar a partir destas definições? Há muito tempo, a Quarta
Internacional reconheceu a necessidade de derrotar a burocracia através de uma
insurreição revolucionária dos trabalhadores. Nenhuma outra coisa poderia e nem
pode ser proposta por aqueles que proclamam que a burocracia é uma “classe”
exploradora.
Com
a derrota da burocracia, o objetivo a ser alcançado, é o restabelecimento do
governo dos sovietes (conselhos) expulsando de seu interior a atual burocracia.
Os
críticos de esquerda não propõem nem poderiam propor algo diferente. A
tarefa dos sovietes regenerados é colaborar com a revolução mundial e com a
construção de uma sociedade socialista.
Portanto,
a derrota da burocracia pressupõe a preservação da propriedade do estado e da
economia planificada. É nisto que se encontra o “x” da questão.
É
evidente que a distribuição das forças produtivas entre os diferentes ramos da
economia, e de modo geral todo o conteúdo do plano, serão mudados drasticamente
quando este plano estiver sendo determinado não pelos interesses da burocracia,
mas pelos dos próprios produtores.
Porém,
à medida que o problema da derrota da oligarquia parasitária continue unindo à
manutenção da propriedade nacionalizada (do estado) definimos a próxima
revolução como uma revolução política.
Seja como for, alguns dos nossos críticos (Ciliga, Bruno e outros) querem
defini-las como uma revolução social.
Aceitamos
esta definição. Em essência, o que será modificado? As tarefas da revolução que
estamos discutindo não ficam alternadas em nada.
Como
norma nossos críticos aceitam os fatos tal e qual nós o estabelecemos, há muito
tempo atrás.
Não
acrescentam nada de essencial à apreciação, seja sobre a situação da burocracia
e dos trabalhadores, seja sobre o papel do Kremlin no campo
internacional.
Em
todos esses terrenos, não só não conseguem desafiar nossa análise, mas se
baseiam nela e inclusive se limitam totalmente a ela. A única acusação que
dirigem contra nós é a e que não tiramos as “conclusões” necessárias.
No
entanto uma vez examinadas, parece que estas conclusões possuem um caráter
puramente terminológico.
Nossos
críticos se negam a chamar o estado operário degenerado de estado operário.
Exigem que a burocracia totalitária seja chamada de classe dirigente.
Se
propõem a considerar a revolução contra esta burocracia como uma revolução
social e não política. Se lhes fizéssemos estas concessões terminológicas,
colocaríamos nossos críticos em uma situação muito difícil, pois não saberiam
nem mesmo o que fazer com sua vitória puramente verbal.
Portanto,
seria um monstruoso absurdo romper com os camaradas que possuem uma opinião
diferente da nossa sobre o problema da natureza social da URSS, na medida em
que se solidarizam conosco no que diz respeito às tarefas políticas.
Porém,
por outro lado, estaríamos sendo cegos se ignorássemos as divergências
puramente teóricas, e inclusive terminológicas, uma vez que no curso de novos
desenvolvimentos, podem tomar corpo e sangue e nos levar a conclusões
diametralmente opostas.
Assim
como uma zelosa dona-de-casa não deixa nunca sua casa ficar cheia de teias de
aranha e lixo, assim também um partido revolucionário nunca pode tolerar a
falta da clareza, a confusão e os equívocos. Nossa casa deve conservar-se
limpa!
Para
ilustrar esta idéia, recordarei a questão do Termidor.
Durante
muito tempo, afirmamos que na URSS, o Termidor estava somente sendo preparado,
mas ainda não havia se consumado.
Mais
tarde, analisando a analogia com o Termidor, de uma forma mais precisa e
reflexiva, chegamos à conclusão de que o Termidor já havia acontecido há muito
tempo.
Tal
retificação, aberta, de nosso próprio erro, não suscitou a mínima comoção em
nossas fileiras.
Por
que? Porque a essência dos processos na URSS havia sido compreendida de maneira
idêntica por todos nós, pois havíamos estudado juntos, e todos os dias, o
crescimento da reação.
Para
nós, tratava-se somente de precisar melhor uma analogia histórica, mais nada.
Espero que ainda hoje, apesar do esforço de alguns camaradas para ocultarem as
divergências sobre o problema da “defesa da URSS” – tema que iremos tratar a
seguir – posamos, simplesmente precisando melhor nossas idéias, conservar nossa
unanimidade sobre as bases do programa da Quarta Internacional.
Um desenvolvimento canceroso ou um novo órgão?
Nossos
críticos argumentaram, mais de uma vez, que a atual burocracia soviética se
parece muito pouco com a burocracia burguesa ou com a burocracia operária da
sociedade capitalista; e em grau muito maior que a burocracia fascista,
representa uma formação social nova e muito mais poderosa. Isto é totalmente
correto, e nunca fechamos nossos olhos a este fato.
Porém,
se considerarmos a burocracia soviética como uma “classe”, então seremos
obrigados a afirmar, imediatamente, que essa classe também não se parece, em
nada, com nenhuma das classes proprietárias que conhecemos no passado; e o
resultado, portanto não é dos melhores.
Frequentemente,
qualificamos a burocracia soviética como casta, sublinhando com isso seu
caráter fechado, seu governo arbitrário, e a altivez da camada dirigente, que
consideraram seus progenitores como descendentes dos lábios divinos de Brahma,
enquanto que as massas populares provêm das partes mais vis de sua anatomia.
Porém, mesmo esta definição, também não possui um caráter estritamente
científico.
Sua
vantagem relativa, reside no fato de que o caráter provisório deste termo fica
claro para todos, uma vez que não ocorre a ninguém, identificar a oligarquia de
Moscou à casta hindu dos brâmanes.
A
antiga terminologia sociológica não preparou, e nem poderia preparar, um nome
para um novo fenômeno social que está em processo de evolução (degeneração), e
que não assumiu formas estáveis.
No
entanto, continuamos qualificando a burocracia soviética de burocracia, sem
esquecer suas particularidades históricas.
No
momento, e desde o nosso ponto de vista, isto é suficiente.
Cientifica
e politicamente – e não só terminologicamente – o problema se coloca da
seguinte forma: a burocracia representa um desenvolvimento temporário em um
organismo social, ou este desenvolvimento já se transformou em um órgão
historicamente indispensável?
As
excrescências sociais podem ser produto de uma combinação “acidental” (ou seja,
temporal e excepcional) de circunstâncias históricas. Um órgão social (e toda
classe, inclusive uma classe exploradora, o é) não pode se constituir a não ser
como resultado das profundas exigências internas da própria produção.
Se
não respondemos a esta questão, toda a discussão se degenerará em um estéril
jogo de palavras.
A
justificativa histórica de toda classe governante sempre consistiu nisto: em
que o sistema de exploração por ela dirigido, colocou o desenvolvimento das
forças produtivas em um nível superior.
Indubitavelmente,
o regime soviético deu um poderoso impulso à economia.
Porém,
a origem deste impulso foi a nacionalização dos meios de produção e o inicio da
planificação da economia, e de forma nenhuma, o fato da burocracia ter usurpado
a direção da economia.
Ao
contrario, a burocracia, como sistema, se converteu no pior dos freios ao
desenvolvimento técnico e cultural do país.
Tal
coisa ficou escondida durante certo tempo, pelo fato da economia soviética ter
se ocupado, durante dois decênios, em transplantar e assimilar a tecnologia e a
organização da produção dos países capitalistas avançados. Bem ou mal, o
período de cópias e imitações ainda pôde se acomodar ao automatismo
burocrático, ou seja, à asfixia do espírito de iniciativa e criação.
Porém,
quanto mais se desenvolvia a economia e mais complexas se tornavam as suas
exigências, tanto mais insuportável se tornava o obstáculo do regime
burocrático.
A
contradição sempre crescente entre uma e outra leva a convulsões políticas
incessantes, ao extermínio sistemático dos elementos criadores mais iminentes
em todos os terrenos de atividade.
Assim,
antes de se exsudar como “classe dirigente”, a burocracia entrou em contradição
irreconciliável com as exigências do desenvolvimento.
A
explicação para tal coisa, deve ser buscada exatamente no fato de que a
burocracia não é a portadora de um novo sistema econômico próprio, que sem ela
se torna impossível, mas é uma excrescência parasitária em um estado operário.
A
oligarquia soviética possui todos os defeitos das velhas classes dirigentes,
sem possuir a missão histórica destas.
Na
degeneração burocrática do estado soviético, não são as leis gerais da
sociedade contemporânea, do capitalismo ao socialismo, as que encontram sua
expressão, mas sim um reflexo particular, excepcional e temporário dessas leis,
nas condições de um país revolucionário atrasado em um meio capitalista.
A
escassez dos bens de consumo e a luta geral por sua obtenção dão origem ao
surgimento de um policial, que se atribui a função de distribuição desses
bens.
A
pressão hostil exercida a partir do exterior impõe ao policial, o papel de
“defensor” do país, lhe dá uma autoridade nacional e lhe permite dessa forma,
saquear duplamente o país.
No
entanto, ambas as condições para a onipotência da burocracia (o atraso do país
e a vizinhança imperialista) possuem um caráter temporário e transitório e
devem desaparecer com a vitória da revolução internacional.
Os
próprios economistas burgueses calcularam que, com uma economia planificada,
poder-se-ia elevar rapidamente a renda nacional dos EUA para 200 bilhões de
dólares anuais e desta forma, garantir a toda população não só a satisfação de
suas necessidades elementares, mas inclusive um verdadeiro bem-estar.
Por
outro lado, a revolução internacional significa o fim do perigo proveniente do
exterior, causa suplementar da burocratização.
A
eliminação da necessidade de se gastar uma parte enorme da renda nacional em
armamentos, aumentaria ainda mais o nível de vida e o nível cultural das
massas.
Nestas
condições, a necessidade de um policial-distribuidor desapareceria por si
mesmo. A administração, como uma cooperativa gigantesca, substituiria muito
rapidamente o poder estatal.
Não
haveria lugar para uma nova classe dirigente e nem para um novo regime de
exploração, situado entre o capitalismo e socialismo.
A
desintegração do capitalismo, assim como a desintegração da velha classe
dirigente alcançou limites extremos.
É
impossível a permanência deste sistema. As forças produtivas devem ser
organizadas de acordo com um plano.
Porém,
quem levará a cabo esta tarefa? O proletariado ou uma nova classe de
“comissários” (políticos, administradores e técnicos)?
De
acordo com a opinião de alguns pensadores, a experiência histórica demonstra
que não se pode ter esperanças no proletariado.
O
proletariado se mostrou “incapaz” de impedir a última guerra imperialista,
apesar do fato de que naquele momento já existiam as condições materiais para a
revolução socialista.
Após
a guerra, a vitória do fascismo foi novamente conseqüência da “incapacidade” do
proletariado para tirar a sociedade capitalista do beco sem saída. Por sua vez,
a burocratização do estado soviético foi conseqüência da “incapacidade” do
próprio proletariado para negar a sociedade através de um mecanismo
democrático.
A
revolução espanhola foi estrangulada pelas burocracias fascistas e stalinistas,
ante os mesmos olhos do proletariado mundial.
Por
fim, o último elo desta cadeia, é a nova guerra imperialista, cuja preparação
tomou forma aberta, com uma total impotência por parte do proletariado mundial.
Se
esta concepção for aceita, ou seja, se se admite que o proletariado não possui
forças para levar a cabo a revolução socialista, então obviamente, a urgente
tarefa de estatizar as forças produtivas será levada a cabo por outros.
Por
quem? Por uma nova burocracia que substituirá a burguesia decadente, como uma
nova classe dirigente em escala mundial é dessa forma que o problema começou a
ser colocado por aqueles “esquerdistas”, que não se cansam de debater em cima
de palavras.
Pela
própria evolução dos acontecimentos, este problema agora é colocado de forma
bastante concreta.
Teve
inicio a Segunda Guerra Mundial. Tal coisa confirma, sem qualquer sombra de
duvidas, que a sociedade não pode continuar vivendo sobre as bases do
capitalismo. Deste modo, submete o proletariado a uma nova e talvez decisiva
prova.
Se,
como acreditamos firmemente, esta guerra provoca uma revolução proletária, ela
levará inevitavelmente à derrota da burocracia da URSS e à regeneração da
democracia soviética sobre bases econômicas e culturais muito mais elevadas do
que em 1918.
Neste
caso, o problema de se a burocracia stalinista era uma “classe” ou uma
excrescência no estado operário se resolverá automaticamente.
Para
qualquer pessoa, ficará claro que, no processo de desenvolvimento de revolução
mundial, a burocracia soviética foi somente uma recaídaepisódica.
No
entanto, se se admite que a guerra atual provocará não a revolução, mas um
declínio do proletariado, então resta outra alternativa: a maior decadência do
capitalismo monopolista, sua maior fusão com o estado, e a substituição da
democracia ali aonde ainda existia por um regime totalitário.
Atualmente,
e sob estas condições, a incapacidade do proletariado para tomar em suas mãos a
direção da sociedade, poderia levar ao crescimento de uma nova classe
exploradora, a partir da burocracia fascista bonapartista.
De
acordo com essas evidências, este seria um regime de decadência, que
assinalaria a eclipse da civilização.
Resultado
análogo poderia se dar no caso em que o proletariado dos países capitalistas
avançados, tendo conquistado o poder, se mostrasse incapaz de conservá-lo e o
abandonasse nas mãos de uma burocracia privilegiada, como no caso da
URSS.
Então,
seríamos obrigados a reconhecer que a razão da recaída burocrática está baseada
não no atraso do país, e nem no cerco imperialista, mas na incapacidade
congênita do proletariado, de se converter em classe dirigente.
Então,
seria necessário estabelecer retrospectivamente, que em seus traços
fundamentais, a atual URSS foi precursora de um novo regime explorador em
escala internacional.
Nos
distanciamos muito da controvérsia terminológica sobre a nomenclatura do estado
soviético. Porém, não deixamos nossos críticos protestarem.
Somente
levando-se em conta a necessária perspectiva histórica pode-se fazer um juízo
correto sobre um problema como o da substituição de um regime social por
outro.
A
alternativa histórica, levada até o fim, é a seguinte: ou o regime
de Stalin é uma recaída detestável no processo de transformação da
sociedade burguesa em uma sociedade socialista, ou o regime de Stalin é
o primeiro estágio de uma nova sociedade exploradora.
Se
a segunda hipótese mostrar-se correta, então, logicamente, a burocracia se
converterá em uma nova classe exploradora.
Por
mais custosa que seja a segunda perspectiva, se o proletariado se mostrasse
realmente incapaz de cumprir a missão que lhe impõe o curso dos acontecimentos,
restaria somente reconhecer que o programa socialista, baseado nas contradições
internas da sociedade capitalista, acabou sendo uma utopia.
E,
por si só, estaria evidente que seria necessário um novo programa “mínimo” para
a defesa dos interesses dos escravos da sociedade burocrática totalitária.
Porém,
existem dados objetivos tão incontrovertidos ou talvez, tão impressionantes,
que hoje nos obriguem a renunciar à perspectiva da revolução socialista? Esta é
a questão.
Pouco
depois da subida de Hitler ao poder, um “comunista de esquerda”
alemão, Hugo Urbahns, chegou à conclusão de que ao invés do capitalismo, estava
iminente uma nova era histórica de “capitalismo de estado”.
Os
primeiros exemplos desse regime que Urbahns assinalou foram a Itália, a URSS e
a Alemanha.
No
entanto, não tirou as conclusões políticas de sua teoria. Recentemente, um
“comunista de esquerda” italiano, Bruno R., que anteriormente havia aderido a
Quarta Internacional, chegou à conclusão de que o “coletivismo burocrático”
substituiria o capitalismo (Bruno R., La Bureaucratisation du Munde, Paris, 1939).
A
nova burocracia é uma classe, uma relação com os trabalhadores é a exploração
coletiva, os proletários se converteram nos escravos dos exploradores
totalitários.
Bruno
R. coloca num mesmo nível a economia planificada na URSS, o fascismo, o
nacional-socialismo e o New Deal de Roosevelt.
Sem
dúvidas, todos estes regimes possuem características comuns, que, em última
instância, estão determinadas pelas tendências coletivistas da economia
moderna.
Inclusive
antes da revolução de outubro, Lênin formulou as principais
particularidades do capitalismo imperialista desta forma: concentração
gigantesca das forças produtivas, crescente grau de fusão do capitalismo
monopolista com o estado, e a tendência orgânica em direção à ditadura pura,
como resultado desta fusão.
As
características da centralização e da coletivização, determinam tanto a
política da revolução como a da contra-revolução; porém, de forma alguma, isto
significa que seja possível se igualar a revolução, o Termidor, o fascismo e o
“reformismo”, como resultado da prostração política da classe operária.
O
fenômeno, em si mesmo, é incontestável. Porém, onde estão seus limites e qual o
seu peso histórico?
O
que nós aceitamos como uma deformação de um período transitório, como o
resultado do desenvolvimento desigual de múltiplos fatores no processo social,
é considerado por Bruno R. como uma formação social independente, na qual a
burocracia é a classe dirigente.
De
todas as formas, Bruno R. tem o mérito de tirar o problema do círculo vicioso
dos exercícios terminológicos em cadernos escolares e passá-lo ao plano das
generalizações históricas mais importantes. Isso faz com que fique mais fácil
descobrir o seu erro.
Como
muitos ultra-esquerdistas, Bruno R. identifica, em essência, o stalinismo com o
fascismo.
Por
um lado, a burocracia soviética adotou os métodos políticos do fascismo; por
outro, a burocracia fascista, que continua limitando-se a medidas “parciais” de
intervenção estatal, está se dirigindo e logo vai alcançar a estatização
completa da economia.
A
primeira afirmação é absolutamente correta. Porém, a afirmação de Bruno de que
o “anti-capitalismo” fascista seja capaz de chegar à expropriação da burguesia,
é completamente equivocada.
As
medidas “parciais” de intervenção estatal e nacionalização, diferem na
realidade da economia planificada de estado, tanto quanto a reforma difere da
revolução.
Mussolini e Hitler estão
somente “coordenando” os interesses dos proprietários e “regulando” a economia
capitalista, e além disso tudo, principalmente para fins bélicos.
A
oligarquia do Kremlin é, repitamos, outra coisa: tem a oportunidade de dirigir
a economia como organismo, só pelo fato da classe operária russa ter levado a
cabo a maior virada nas relações de propriedade de toda a história. Esta
diferença não pode ser deixada de lado.
Porém,
mesmo que admitamos que o socialismo e o fascismo vindo de pólos opostos,
cheguem um dia a ser o mesmo tipo de sociedade exploradora (“coletivismo
burocrático”, de acordo com a terminologia de Bruno R.), isto ainda não tirará
a humanidade de seu beco sem saída.
A
crise do sistema capitalista não é produzida somente pelo papel reacionário da
propriedade privada, mas também pelo não menos reacionário papel do estado
nacional.
Inclusive
se os diferentes governos fascistas tiverem êxito em estabelecer um sistema de
economia planificada em seu país, então – a longo prazo – à margem dos
inevitáveis movimentos revolucionários do proletariado, imprevisíveis em
qualquer plano, a luta entre os estados totalitários para a dominação mundial
continuará, e inclusive se intensificaria.
As
guerras devorariam os frutos da economia planificada e destruiriam as bases da
civilização. É certo que Bertrand Russel acha que como resultado da guerra,
algum estado vitorioso, pudesse unificar o mundo inteiro em um cárcere
totalitário.
Porém,
mesmo que esta hipótese se realizasse, coisa que é altamente duvidosa, a
“unificação” militar não teria maior estabilidade do que o tratado de
Versalhes.
Os
levantes nacionais e as pacificações culminariam em uma nova guerra mundial,
que seria a sepultura da civilização.
Não
são os nossos desejos subjetivos, mas a realidade objetiva, o que indica que o
único caminho para a humanidade é a revolução socialista mundial. A alternativa
para isso é a volta à barbárie.
Muito
breve deveremos dedicar um artigo, em separado, à questão da relação entre a
classe e sua direção.
Aqui,
devemos nos limitar só ao mais indispensável. Somente “marxistas” vulgares, que
consideram que a política é um “reflexo” direto e simples da economia, são
capazes de pensar que a direção reflete a classe, direta e simplesmente.
Na
realidade, a direção, tendo se elevado acima da classe oprimida, sucumbe
inevitavelmente à pressão da classe dominante. Por exemplo, a direção dos
sindicatos norte-americanos, “reflete” não tanto o proletariado, mas a
burguesia.
A
seleção e educação de uma verdadeira direção revolucionária, capaz de resistir
à pressão da burguesia, é uma tarefa extraordinariamente difícil.
A
dialética do processo histórico se expressou de forma extremamente brilhante no
fato de que o proletariado do país mais atrasado, a Rússia, sob certas
condições históricas, deu lugar à direção mais sagaz e à mais corajosa.
Ao
contrário, o proletariado do país com a mais antiga cultura capitalista, a
Grã-Bretanha, possui, inclusive hoje, a mais estúpida e servil das direções.
A
crise da sociedade capitalista, que tomou um caráter mais aberto em julho de
1914, produziu uma crise aguda na direção proletária, a partir do primeiro dia
da guerra.
Durante
os 25 anos que transcorreram desde então, o proletariado dos países
capitalistas avançados ainda não criaram uma direção que possa estar à altura
das tarefas de nossa época.
No
entanto, a experiência da Rússia demonstra que tal direção pode ser criada.
(Isso não significa, logicamente, que estaria imune à degeneração).
Consequentemente,
a questão está colocada de seguinte maneira: a necessidade histórica objetiva,
em seu longo caminho, abrirá seu próprio espaço na consciência da vanguarda da
classe operária? Ou seja, no processo desta guerra e destas profundas comoções
que deverá engendrar, formar-se-á uma verdadeira direção revolucionária, que
seja capaz de dirigir o proletariado rumo à conquista do poder?
A
Quarta Internacional responde esta questão afirmativamente, não só através do
texto de seu programa, mas também através do fato
mesmo de sua existência.
Todas
as distintas variedades de representantes desiludidos e atemorizados do
pseudo-marxismo, atuam,pelo
contrário, baseados na suposição de que a
bancarrota da direção “reflete” somente a incapacidade do proletariado para
levar a cabo sua missão revolucionária.
Nem
todos nossos opositores expressam claramente este pensamento, mas todos eles –
ultra-esquerdistas, centristas, anarquistas, para não mencionar os stalinistas
e os social-democratas – descarregam sua responsabilidade pelas derrotas nas
costas do proletariado.
Nenhum
deles assinala sob que condições precisas o proletariado será capaz de levar a
cabo a virada socialista.
Se
admitirmos que é verdade que a causa das derrotas residem nas qualidades
sociais do próprio proletariado, então a situação da sociedade moderna deverá
ser considerada como desesperadora. Sob as condições do capitalismo decadente,
o proletariado não cresce nem numericamente e nem culturalmente.
Portanto,
não existem motivos para esperar que em algum momento se coloque à altura das
tarefas revolucionárias.
A
questão se apresenta de forma completamente diferente para aquele que tem claro
o profundo antagonismo que existe entre a exigência orgânica, profunda e
insuperável das massas trabalhadoras para se libertarem do sangrento caos
capitalista, e o cadáver conservador, patriótico e completamente burguês da
direção do movimento operário, que sobrevive por si mesma.
Devemos
escolher entre uma destas duas concepções irreconciliáveis.
A
revolução de outubro não foi um acidente. Havia sido prevista há tempos. Os
acontecimentos confirmaram esta previsão.
A
degeneração não refuta a previsão, porque os marxistas nunca acreditaram que um
estado operário isolado na Rússia pudesse se manter indefinidamente.
Esperávamos,
é certo, a destruição do estado soviético ao invés de sua degeneração; ou mais
corretamente, não diferenciávamos o suficiente entre estas duas
possibilidades.
Porém,
elas não se contradizem de forma alguma. Em certo estágio, a degeneração acaba
inevitavelmente na destruição.
Um
regime totalitário, seja do tipo stalinista ou do tipo fascista, devido à sua
própria essência, só pode ser um regime transitório, temporário. Na história, a
ditadura pura geralmente foi produto e o sinal de uma crise social
especialmente séria, e de forma alguma, de um regime estável.
As
crises agudas não podem ser uma situação permanente da sociedade.
Um
estado totalitário é capaz de suprimir as contradições sociais durante um certo
período, mas é incapaz de se perpetuar. As purgas monstruosas na URSS são o
testemunho mais convincente de que a sociedade soviética tende, organicamente,
a recusar a burocracia.
É
algo realmente estranho que Bruno R. veja exatamente nas purgas stalinistas, a
prova de que a burocracia se converteu em classe dirigente, pois em sua
opinião, somente uma classe dirigente é capaz de tomar medidas de tal
amplitude.
Sem
dúvida, esquece que o czarismo, que não era uma “classe”, também se permitiu
tomar medidas de grande escala nas purgas, e mais ainda, exatamente no período
em que estava se aproximando de seu fim.
Sintoma
da proximidade de sua agonia mortal, pela extensão e fraudulência monstruosa de
suas purgas, Stalin não nos testemunha outra coisa a não ser a
incapacidade da burocracia para se transformar em uma classe dirigente estável.
Não
ficaremos em uma posição ridícula se justamente alguns anos antes ou alguns
meses antes da queda desonrosa da oligarquia bonapartista, lhe dermos a
denominação de nova classe dirigente?
Em
nossa opinião, colocar claramente esta questão, isolará os camaradas das
experiências terminológicas e das generalizações extremamente ligeiras.
Já
se demonstrou que um quarto de século é espaço de tempo muito curto para o
rearmamento revolucionário da vanguarda proletária mundial, e um período muito
longo para se manter o sistema soviético intacto e isolado em um país atrasado.
A
humanidade agora está pagando por isso, com uma nova guerra imperialista; mas a
tarefa básica de nossa época não mudou só porque não foi solucionada.
No
último quarto de século, uma conquista colossal e uma mostra inapreciável para
o futuro é constituída pelo fato de que um dos destacamentos do proletariado
mundial foi capaz de demonstrar na ação como esta
tarefa deve ser resolvida.
A
segunda guerra imperialista coloca esta tarefa, ainda não solucionada, num
nível histórico muito mais elevado.
Novamente,
põe à prova, não só a estabilidade dos regimes existentes, mas também a
capacidade do proletariado para substituir esses regimes.
O
resultado desta prova terá, indubitavelmente, um significado decisivo para
nossa avaliação sobre a época contemporânea, como uma época da revolução
proletária.
Se,
ao contrário de todas as probabilidades, a revolução de outubro não encontrar,
no curso da guerra atual ou imediatamente depois, sua continuação em algum dos
países avançados; e se ao contrario, o proletariado for acossado em todas as
frentes, então sem dúvidas, deveremos colocar a questão de revisar nossa
concepção da época atual e suas forças motrizes.
Neste
caso, tratar-se-ia não de grudar uma etiqueta sobre a URSS ou o bando
de Stalin, mas de reconsiderar a perspectiva histórica mundial para as
próximas décadas, e talvez séculos: entramos na época da revolução social e da
sociedade socialista, ou ao contrário, entramos na época da decadente sociedade
da burocracia totalitária?
O
duplo erro dos esquemáticos como Hugo Urbahns e Bruno R., consiste primeiro em
que proclamam que este regime já foi finalmente instaurado; e segundo, que
definem como um estado transitório prolongado da sociedade entre o capitalismo
e o socialismo.
Já
é absolutamente evidente que se o proletariado internacional, como resultado da
experiência de toda nossa época e da presente nova guerra, mostrar-se incapaz
de se converter em dono da sociedade, isto significaria a perda de toda a
esperança para a revolução socialista, uma vez que é impossível esperar outras
condições mais favoráveis para isso; em qualquer caso, agora nada é capaz de
prever ou caracterizar tal coisa.
Os
marxistas não têm o menor direito (se a desilusão e o cansaço não são
considerados “direitos”) de chegar à conclusão de que o proletariado perdeu
suas possibilidades revolucionárias e deve renunciar a todas as aspirações de
hegemonia na era imediatamente próxima.
Na
escalada da história, quando se trata de profundas mudanças nos sistemas
econômicos e cultural, vinte e cinco anos pesam menos que uma hora na vida de
um homem.
Em
que medida um homem é justo quando por causa de fracassos empíricos que
acontecem no decorrer de uma hora ou um dia, renuncia aos objetivos que tinha,
baseado na experiência e análise de toda a sua vida anterior?
Durante
os anos da mais negra reação russa (1907-1917), tomávamos como nosso ponto de
partido aquelas possibilidades que o proletariado russo havia revelado em
1905.
Nos
anos da reação mundial, devemos partir das possibilidades que o proletariado
russo revelou em 1917.
A
Quarta Internacional não se chama partido mundial de revolução socialista por
casualidade.
Nosso
caminho não será mudado. Orientamos nosso curso em direção da revolução mundial,
em virtude deste mesmo fato, em direção à regeneração da URSS como estado
operário.
O
que defendemos na URSS? Não são aquelas coisas nas quais a URSS se parece com
os países capitalistas, mas precisamente aquilo em que ela se diferencia
destes.
Na
Alemanha, também defendemos uma insurreição contra a burocracia dirigente,
porém só para derrotar imediatamente a propriedade capitalista.
Na
URSS, a derrota da burocracia é indispensável para a preservação da propriedade
estatal. Estamos pela defesa da URSS somente neste sentido.
Entre
nós, não existe nada que coloque em dúvida o fato de que os operários
soviéticos devam defender a propriedade estatal, não só contra o parasitismo da
burocracia, mas também contra as tendências restauradoras da propriedade
privada, por exemplo, pela aristocracia kolkosiana.
Porém,
depois de tudo isso, a política externa é a continuação da política
interna.
Se
em termos de política interna ligamos a defesa das conquistas da Revolução de
Outubro, com a luta irreconciliável contra a burocracia, também devemos fazer o
mesmo com relação à política externa.
Sem
dúvidas, Bruno R., de acordo com o fato de que o “coletivismo burocrático” saiu
vitorioso em todas as frentes, nos assegura que nada ameaça a propriedade
estatal, porque Hitler (e Chamberlain?) estão tão interessados
quanto Stalin na sua manutenção (logo verá!).
É
triste dizer, mas as afirmações de Bruno R., são frívolas.
Em
caso de vitória, certamente Hitler começaria por defender a devolução
de todas as propriedades que foram expropriadas aos capitalistas alemães;
depois, asseguraria a mesma coisa aos capitalistas ingleses, franceses, belgas,
uma vez que chegaria a um acordo com eles, às custas da URSS; por fim, faria da
Alemanha o principal contratador das mais importantes empresas estatais da
URSS, favorecendo os interesses da máquina militar alemã.
Agora Hitler é
um aliado e amigo de Stalin; porém, se com a ajuda de Stalin, Hitler conseguir
sair vitorioso na frente Oeste, na manhã seguinte voltará seus canhões contra a
URSS. E finalmente, também Chamberlain, em circunstâncias semelhantes,
atuaria da mesma forma que Hitler.
Os
erros existentes sobre o problema de defesa da URSS, normalmente partem de uma
compreensão incorreta dos métodos de “defesa”.
De
forma alguma, a defesa da URSS significa se aproximar da burocracia do Kremlin,
aceitar sua política, ou conciliar com a política de seus aliados. Nesta
questão, assim como em todas as outras, permanecemos completamente no terreno
da luta de classes internacional.
Recentemente,
no minúsculo jornal francês Que faire?,
dizia-se que como os “trotskystas” são derrotistas com relação à França e à
Inglaterra, eles também são derrotistas com relação à URSS.
Em
outras palavras: se você quiser defender a URSS, deixe de ser derrotista em
relação aos seus aliados imperialistas. Que faire? Pensou
que as “democracias” seriam os aliados da URSS.
O
que estes sábios estão dizendo agora, não sabemos. Porém, dificilmente seria
algo importante, uma vez que seu método está podre.
Renunciar
ao derrotismo com relação ao campo imperialista, ao qual a URSS hoje adere ou
aderirá amanhã, é empurrar os operários do campo inimigo para o lado de seu
governo; significa renunciar ao derrotismo em geral.
Sob
as condições de uma guerra imperialista, a renuncia ao derrotismo, que é
equivalente à negação da revolução socialista – negar a revolução em nome da
“defesa da URSS” – sentenciará a URSS à decomposição final e à ruína.
“Defesa
da URSS” segundo a interpretação do Comintern, assim como a “luta contra o
fascismo” de ontem, está baseada na negação da política de independência de
classe.
O
proletariado é transformado – por distintas razões, em circunstâncias variadas,
mas sempre e invariavelmente – em força auxiliar de um campo burguês contra
outro campo burguês.
Contrastando
com isso, alguns de nossos camaradas dizem: na medida em que não queremos nos converter
em aliados de Stalin e seus aliados, renunciamos a sua compreensão de
“defesa” coincide exatamente com a compreensão dos oportunistas; não pensam em
termos de política independente por parte do proletariado.
Como
questão de fato, defendemos a URSS como defendemos as colônias, como resolvemos
todos os nossos problemas, não apoiando alguns governos imperialistas contra
outros, mas com o método da luta de classes internacional, tanto nas colônias
como nos centros metropolitanos.
Não
somos um partido governamental; somos o partido da oposição irreconciliável,
não só nos países capitalistas, mas também na URSS. Nossas tarefas, entre elas
a “defesa da URSS”, não são levadas a cabo através de governos burgueses, nem
muito menos do governo da URSS, mas exclusivamente através da educação das
massas, através da agitação, explicando aos operários o que devem defender e o
que devem derrotar. Tal “defesa” não pode ter resultados imediatos milagrosos.
Mas não pretendemos nos transformar em santos milagrosos.
Na
situação atual, tal e como as coisas se apresentam, somos uma minoria
revolucionária.
Nosso
trabalho deve ser orientado de forma que os operários, sob os quais temos
influência, possam apreciar corretamente os acontecimentos, não sejam colhidos
de surpresa e preparem o sentimento geral de sua própria classe para a solução
revolucionária das tarefas que confrontamos.
A
defesa da URSS, para nós, coincide com a preparação da revolução mundial.
Somente aqueles métodos que não entrem em conflito com os interesses da
revolução são admissíveis.
A
defesa da URSS está ligada à revolução socialista mundial, assim como uma
tarefa tática está ligada a uma estratégia.
Uma
tática está subordinada a um fim estratégico e de forma nenhuma pode entrar em
contradição com este último.
Enquanto
escrevo estas linhas, a questão dos territórios ocupados pelo exército vermelho
ainda permanece obscura.
Os
despachos telegráficos se contradizem uns com os outros, à medida que ambas as
partes mentem muito; mas as atuais relações nos campos de batalha são, sem
dúvidas, extremamente agitadas. A maior parte dos territórios ocupados serão,
sem sombra de dúvidas, parte da URSS. De que forma?
Vamos
admitir por um momento, que de acordo com o tratado de Hitler, o governo de Moscou deixe intacto os direitos de
propriedade privada nas zonas ocupadas e se limite a “controlar”, de acordo com
o modelo fascista.
Tal
concessão teria um caráter profundamente principista e poderia ser o ponto de
partida para um novo capítulo na história do regime soviético; e
consequentemente, de nossa parte, um ponto de partida para uma nova avaliação
da natureza do estado soviético.
No
entanto, é mais provável que nos territórios que foram planejados para fazer
parte da URSS, o governo de Moscou atue expropriando os grandes proprietários e
estatizando os meios de produção.
Esta
variante é a mais provável, não porque a burocracia continue sendo fiel ao
programa socialista, mas porque não deseja e nem é capaz de tomar o poder e os
privilégios que comparte com a velha classe dirigente nos territórios ocupados.
Aqui, é forçosa uma analogia literal.
O
primeiro Bonaparte deteve a revolução através de uma ditadura
militar. No entanto, quando as tropas francesas invadiram a
Polônia, Napoleão assinou um decreto: “A servidão está abolida”.
Tal
medida foi adotada, não porque Napoleão simpatizasse com os camponeses,
e nem por princípios democráticos, mas pelo fato da ditadura bonapartista se
basear em relações de propriedade burguesa e não feudais.
À
medida em que a ditadura bonapartista de Stalin se baseia na
propriedade estatal e não na privada, a invasão da Polônia pelo exército
vermelho levará, por si só, à abolição da propriedade privada capitalista, da
mesma forma que fará com que o regime dos territórios ocupados estejam de
acordo com o regime da URSS.
Esta
medida, de caráter revolucionário – “a expropriação dos expropriadores” – neste
caso é levada a cabo de forma burocrático-militar.
O
chamado à ação independe das massas nos novos territórios – e sem tal chamado,
inclusive formulado com extrema prudência é impossível constituir um novo
regime – seria indubitavelmente esmagado no dia seguinte, por desapiedosas
medidas policialescas, visando assegurar a predominância da burocracia sobre as
massas revolucionárias vigilantes. Este é um lado da questão. Mas existe o
outro.
Visando
a possibilidade de ocupar a Polônia através de uma aliança militar
com Hitler, durante muito tempo o Kremlin cansou e continua cansando as
massas da URSS e no mundo inteiro, e com isso, desorganizou completamente as
fileiras de sua própria Internacional Comunista.
O
critério político prioritário, não é, para nós, a transformação das relações de
propriedade nesta ou naquela área, por mais importantes que sejam, mas a
mudança na consciência e organização do proletariado mundial, a elevação de sua
capacidade de defender as conquistas obtidas e conquistar outras novas.
A
partir deste único e decisivo ponto de vista, a política de Moscou, tomada em
seu conjunto, conserva completamente o seu caráter reacionário, e é o principal
obstáculo no caminho da revolução mundial.
No
entanto, nossa análise geral sobre o Kremlin e o Comintern, não modifica o
fato particular de que a estatização da propriedade, nos territórios ocupados,
é em si mesmo uma medida progressiva.
Reconhecemos
isso abertamente. Se amanhã Hitler lançar seus exércitos contra o
Leste, para restaurar a “lei e a ordem” na Polônia Oriental, os operários avançados
defenderão, contra Hitler, estas novas formas de propriedade estabelecidas
pela burocracia bonapartista soviética.
Como
dissemos, a estatização dos meios de produção é uma medida progressiva. Porém,
sua progressividade é relativa; seu peso específico depende da soma total de
todos os fatores restantes.
Assim,
devemos constatar primeiro e principalmente, que a extensão do território
dominado pela autocracia burocrática e pelo parasitismo, encobertas pelas
medidas socialistas, podem aumentar o prestígio do Kremlin, engendrar ilusões
sobre a possibilidade de substituir a revolução proletária por manobras
burocráticas, e tudo o mais.
Este
dano, ultrapassa de longe o conteúdo progressivo das reformas stalinistas na
Polônia.
Para
que a propriedade nacionalizada nas áreas ocupadas, assim como na URSS, seja à
base de um genuíno progresso, ou seja, base para o desenvolvimento socialista,
é necessário derrotar a burocracia de Moscou. Nosso programa, consequentemente,
conserva toda sua validade.
Os
acontecimentos não nos surpreenderam.
Só
precisamos interpretá-los corretamente. É preciso entender claramente que no
caráter da URSS e em sua posição internacionalista, estão contidas contradições
agudas.
É
impossível se livrar destas contradições com a ajuda de jogos de tipo
terminológico (“Estado operário” – “Estado não-operário”).
Devemos
considerar os fatos tais como eles se apresentam. Devemos traçar nossa política
tomando como ponto de partida as reais relações e contradições.
Não
confiamos nenhuma missão histórica ao Kremlin. Estivemos e continuamos contra
ocupações de novos territórios pelo Kremlin.
Estamos
pela independência da Ucrânia soviética, e se os bielo-russos quiserem, também
da Bielo-Rússia soviética. Ao mesmo tempo, nas partes da Polônia ocupadas pelo
exército russo, os partidários da Quarta Internacional devem jogar um papel
decisivo na expropriação dos grandes proprietários de terra e capitalistas, na
distribuição de terra entre os camponeses, na criação de sovietes e comitês
operários etc.
Enquanto
fazem isso, devem conservar sua independência política, devem lutar, nas
eleições para os sovietes e comitês de fábrica, pela total independência destes
organismos frente à burocracia, e devem realizar propaganda revolucionária no
espírito de desconfiança com relação ao Kremlin e seus agentes locais.
Porém,
suponhamos que Hitler aponte seus canhões para o Leste e invada os
territórios ocupados pelo exército vermelho.
Sob
estas condições, os partidários da Quarta Internacional, sem modificar de forma
alguma sua atitude frente à oligarquia do Kremlin, colocarão como a mais
urgente tarefa do movimento, a resistência militar contra Hitler.
Os
operários dirão: “Não podemos deixar
que Hitler derrote Stalin; isso é tarefa nossa”. Durante a luta militar contra Hitler, os
operários revolucionários devem se esforçar para manter as relações, as mais
fraternas possíveis, com a base dos lutadores do exército vermelho.
Enquanto
isso com as armas nas mãos, lutam contra Hitler, os bolcheviques deverão
ao mesmo tempo, fazer propaganda revolucionária contra Stalin, preparando
sua derrota para a próxima, a talvez muito próxima, etapa.
Este
tipo de “defesa da URSS”, naturalmente será diferente – tanto quanto o céu é
diferente da terra – da defesa oficial que agora é levada a cabo sob o lema:
“Pela Pátria! Por Stalin!”. Nossa defesa
da URSS é colocada sob o lema: “Pelo socialismo! Pela Revolução Mundial! Contra Stalin”.
Para
que estas duas variantes de “defesa da URSS” não se confundam na consciência
das massas, é necessário conhecer claramente e precisamente como formular
palavras-de-ordem que correspondam à situação concreta. Porém, acima de tudo, é
necessário estabelecer claramente o que estamos
defendendo e como estamos defendendo isso e contra quem estamos
defendendo isso.
Nossas
palavras-de-ordem criarão uma confusão entre as massas, somente se não tivermos
uma clara concepção de nossas tarefas.
Seja
como for, agora não temos razões para modificar nossa posição principista em
relação à URSS.
A guerra acelera os distintos processos políticos. Pode ser que acelere o processo de regeneração revolucionária da URSS. Mas também pode ser que acelere o processo de degeneração final.
Por
isso, é indispensável que continuemos pacientemente e sem preconceitos, estas
modificações que a guerra introduz na vida interna da URSS, de forma que
possamos dar conta delas a tempo.
Nos
territórios ocupados, nossas tarefas continuam sendo basicamente as mesmas que
na URSS; mas na medida em que estão colocadas de forma extremamente aguda por
causa dos acontecimentos, permite que clarifiquemos muito mais as nossas
tarefas gerais com relação à URSS.
Devemos
formular nossas palavras-de-ordem de tal forma, que os operários vejam
claramente o que é que estamos defendendo na URSS (propriedade estatal e
economia planificada) e contra quem estamos levando uma luta implacável (a
burocracia parasitária e seu Comintern).
Não
devemos perder de vista, por um só momento, o fato de que para nós, a questão
da derrubada da burocracia soviética está subordinada à questão da preservação
da propriedade estatal dos meios de produção na URSS; que a questão da
manutenção da propriedade estatal nos meios de produção da URSS está
subordinada, para nós, à questão da revolução proletária mundial.
Coyoacán (México) 25 de setembro de 1939
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