Por
As decisões podem estar tecnicamente corretas. Mas não deixam de me incomodar.
Regivaldo Pereira Galvão, um dos condenados pela morte da missionária
norte-americana Dorothy Stang, ocorrida em fevereiro de 2005, em Anapu
(PA), foi solto por liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello,
do Supremo Tribunal Federal, no dia 23.
Foram seis tiros – um deles na
nuca – aos 73 anos, em uma estrada vicinal.
Ela enfrentava ameaças de
morte de fazendeiros da região, descontentes com sua defesa dos
Programas de Desenvolvimento Sustentável como modelos para a Amazônia.
Regivaldo havia sido condenado a 30 anos de prisão como um dos mandantes
do crime, ao lado de Vitalmiro Bastos de Moura – que cumpre pena.
Como
ainda há um recurso que pede a anulação do julgamento, o ministro
concedeu o habeas corpus por entender o processo ainda não acabou.
Uma mulher condenada a dois anos de prisão por ter roubado caixas de
chiclete em Sete Lagoas (MG) foi mantida encarcerada por Marco Aurélio
Mello, do Supremo Tribunal Federal, em maio de 2009. O ministro
justificou que como o furto não era para matar a fome e a ré em questão
já havia sido condenada por outros crimes, ela teria que seguir presa
(processo HC 98944).
Um ano depois, a Primeira Turma do STF também
indeferiu, de forma unânime, o pedido de habenas corpus para o caso do
chiclete. De acordo com a decisão, os ministros analisaram que deve ser
considerado o “interesse da sociedade em inibir práticas criminosas” ao
se utilizar o princípio da insignificância.
(O princípio da insignificância pode ser aplicado quando o caso não
representa riscos à sociedade e não tenha causado lesão ou ofensa grave.
É verdade que o Supremo vem desconsiderando os furtos de pequeno valor
como crime, mas não é sempre.)
Ambas as decisões estão legalmente embasadas.
Mas, seja sincero: não gera a sensação de que algo está errado?
Dezenas de lideranças sociais ameaçadas de morte na Amazônia dormem
apreensivas com a notícia de que a impunidade segue livre. Enquanto
supermercados e docerias podem dormir tranquilos, pois o chiclete está
seguro.
Não é uma questão apenas de mudança de leis, mas de sua aplicação.
Não importa a orientação política e ideológica, um punhado de gente
consegue acesso à Justiça – seja através de um telefone-linha-direta,
seja por ter recursos para pagar bons e influentes advogados com
estrutura para brigar até o último ponto final da lei.
A maioria depende
dos defensores públicos (importantíssima profissão que é maltratada e
sucateada), de Deus (se for uma pessoa de fé) ou da sorte (se não for).
Como ter uma Justiça de verdade se, na prática, ela é aberta e
sorridente para alguns e fechada e mal-encarada para outros?
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