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sábado, 22 de novembro de 2008

A Palavra de Ordem de Assembléia Nacional na China[1*]

Leão Trotsky
2 de Abril de 1930

Parece-me que nossos amigos chineses enfocam a questão das consignas políticas da democracia de maneira demasiado metafísica, inclusive escolástica.


As "dificuldades" começam com o nome: assembléia constituinte ou assembléia nacional. Na Rússia utilizamos a consigna de assembléia constituinte até o momento da Revolução, porque era a que sublinhava de maneira mais enfática a ruptura com o passado.

 Porém, vocês dizem que é difícil formular esta consigna no idioma chinês. Se assim é, podem propor a consigna de assembléia nacional. Para a consciência das massas seu conteúdo dependerá, primeiramente, das implicações dadas pela agitação revolucionária e, em segundo lugar, dos acontecimentos.


 Perguntam-me: "É possível fazer agitação por uma assembléia constituinte ao mesmo tempo em que se nega a sua factibilidade?" Porém, por que temos que decidir de antemão que não é factível? Obviamente, as massas somente apoiarão a consigna se a consideram factível.

Quem instaurará a assembléia constituinte, e como funcionará? Apenas podemos especular. No caso de um debilitamento maior do regime dos militares e do Kuomintang, e de um crescente descontentamento das massas, sobretudo das cidades, pode ser que um setor do Kuomintang, com algum "terceiro partido", tente convocar algo que se pareça a uma assembléia nacional. Obviamente, restringiriam o mais que possível os direitos das classes e setores mais oprimidos.

Nós, os comunistas, entraríamos numa assembléia nacional assim restringida e manipulada? Se não contamos com as forças suficientes para substituí-la, isto é, para tomar o poder, é óbvio que entraríamos. Essa etapa não nos debilitaria, minimamente.

 Ao contrário, nos ajudaria a reunir e desenvolver as forças da vanguarda proletária. Nesta assembléia espúria, e acima de tudo fora da mesma, desenvolveríamos nossa agitação por uma nova assembléia mais democrática. Existindo uma mobilização revolucionária das massas, simultaneamente construiríamos sovietes.

 É muito possível que, num caso, os partidos pequeno-burgueses convoquem uma assembléia nacional relativamente mais democrática, que sirva de dique de contenção diante dos sovietes. Participaríamos nesse tipo de assembléia? Supostamente, sim. Novamente, somente se não contássemos com as forças suficientes para superá-la com um tipo mais elevado de governo, ou seja, com os sovietes. Entretanto, essa possibilidade surge somente no auge do ascenso revolucionário.

 Na atualidade, tal situação está distante.

Mesmo que existissem sovietes na China – e não é o caso –, isso não se constituiria em razão suficiente para abandonar a consigna de assembléia nacional. A maioria dos sovietes poderia estar – no princípio estaria, com toda segurança – em mãos de organizações e partidos conciliadores e centristas. Deveríamos denunciá-los na tribuna livre da assembléia nacional.

Desta maneira, ganharíamos a maioria, mais rápida e seguramente. Uma vez conquistada, deveríamos contrapor o programa dos sovietes ao programa da assembléia nacional, agruparíamos a maioria do país sob a bandeira dos sovietes e isto nos permitiria, nos fatos e não em palavras, substituir a assembléia nacional – instituição democrático-parlamentar – pelos sovietes – organismos da ditadura revolucionária da classe.


Na Rússia, a Assembléia Constituinte durou apenas um dia. Por que? Porque surgiu muito tarde: o poder soviético já existia e entrou em conflito com ela. Neste conflito, a Assembléia Constituinte representava o "antes" da revolução. Todavia, suponhamos que o Governo Provisório burguês houvesse tido a iniciativa de convocar a Assembléia Constituinte em março ou abril. Poderia ser? Claro que sim.

Os kadetes empregaram todas as artimanhas legais para postergar a convocação da Assembléia Constituinte, com a esperança de que a maré revolucionária refluísse. Os mencheviques e os social-revolucionários seguiram os kadetes.

 Se os mencheviques e os social-revolucionários houvessem tido um pouco de iniciativa revolucionária, teriam podido convocá-la em poucas semanas. Os bolcheviques teriam participado nas eleições e na assembléia? Sem dúvida, porque éramos nós os que exigíamos que se convocasse a Assembléia Constituinte o quanto antes.

Uma convocação antecipada da Assembléia teria alterado o curso da revolução, em detrimento do proletariado? De maneira alguma. Talvez vocês recordem que os representantes das classes possuidoras russas e, em sua garupa, os conciliadores, estavam a favor de remeter a resolução de todos os problemas importantes da revolução "para a Assembléia Constituinte", ao mesmo tempo em que retardavam a sua convocação. Isso permitia aos latifundiários e capitalistas a oportunidade de esconder, até certo ponto, seus interesses de proprietários na questão agrária, industrial etc.


Se a Assembléia Constituinte houvesse sido convocada, digamos, em abril de 1917, a mesma haveria de enfrentar todos os problemas sociais. Nesse caso as classes possuidoras teriam sido obrigadas a colocar todas as suas cartas sobre a mesa e o papel traidor dos conciliadores teria sido explicitado.

O bloco bolchevique da Assembléia Constituinte teria conquistado grande popularidade e isso lhe permitiria ganhar a maioria dos sovietes. Em tais circunstâncias, a Assembléia Constituinte não duraria um dia mas, quem sabe, vários meses. Isso enriqueceria a experiência política das massas trabalhadoras, e ao contrário de atrasar a revolução proletária a teria antecipado.

Este fato haveria tido uma importância enorme. Se a Segunda Revolução ocorresse em julho ou agosto, e não em outubro, o exército estaria menos exausto e debilitado na frente e a paz com os Hohenzollern, certamente, teria sido um pouco mais favorável. Ainda, supondo que a Assembléia Constituinte não antecipasse a revolução proletária um dia sequer, a escola de parlamentarismo revolucionária teria deixado sua marca no nível político das massas, facilitando, assim, nossas tarefas posteriores à Revolução de Outubro.

Esta variante pode se dar na China? Não está excluída. Imaginar e esperar que o Partido Comunista chinês dê um salto das atuais circunstâncias – caracterizadas pelo governo de camarilhas militar-burguesas desenfreadas, a opressão e atomização da classe operária e o tremendo refluxo do movimento camponês – à tomada do poder é acreditar em milagres. Na prática, isso conduz à atividade guerrilheira, aventureira, que a Comintern apóia.

 Devemos repudiar essa política e advertir os operários revolucionários a respeito.

Nas circunstâncias atuais – de contra-revolução militar-burguesa –, a primeira tarefa a resolver é a mobilização política do proletariado, que dirija as massas camponesas. A força das massas oprimidas reside em sua quantidade.

Quando despertem, buscarão expressar politicamente essa força numérica mediante o sufrágio universal. Alguns poucos comunistas já sabem que o sufrágio universal é um instrumento da dominação burguesa, e que essa dominação somente pode ser liquidada pela ditadura proletária.

Vocês podem educar, desde já, a vanguarda proletária nesta convicção. Porém, os milhões de trabalhadores apenas se aproximam da ditadura do proletariado através de sua própria experiência política, e a assembléia nacional seria um passo a mais nesse caminho.

 Por isso, levantamos essa consigna junto com outras quatro consignas da revolução democrática: entrega da terra aos camponeses pobres, jornada de trabalho de oito horas, independência da China e direito à autodeterminação para as nacionalidades que habitam o território chinês.

Entende-se que não podemos descartar a perspectiva – teoricamente admissível – de que o proletariado chinês, dirigindo as massas camponesas e apoiando-se nos sovietes, chegue ao poder antes que se constitua uma assembléia nacional, qualquer que seja sua forma.

Porém, no período imediato, isso parece improvável, porque pressupõe a existência de um partido revolucionário do proletariado, poderoso e centralizado. Na falta deste, qual outra força unificará as massas revolucionárias desse gigantesco país? No entanto, devemos lamentar que na China não haja um partido comunista forte e centralizado.

É necessário criá-lo. A luta pela democracia é, precisamente, a condição necessária para isso. A consigna de assembléia nacional uniria os movimentos e insurreições regionais dispersos, lhes daria unidade política e assentaria as bases para a formação do partido comunista como dirigente do proletariado e de todas as massas trabalhadoras em escala nacional.


Por isso, deve-se levantar a consigna de assembléia nacional – em base ao voto universal, direto, igualitário e secreto –, o mais energicamente possível, e organizar uma luta firme e resoluta em torna a ela. Cedo ou tarde a esterilidade da posição puramente negativa da Comintern e da direção oficial do Partido Comunista chinês virá à tona.

Isso ocorrerá com mais rapidez quanto mais resolutamente a Oposição de Esquerda comunista inicie e desenvolva sua campanha pelas consignas democráticas. A queda inevitável da política da Comintern fortalecerá enormemente a Oposição de Esquerda e a ajudará a se converter na força decisiva no proletariado chinês.

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